domingo, 24 de janeiro de 2010

Os Corações Também Se Partem

Com a redução da medicação volta não só a memória mas também a angústia.
A N. começa a aperceber-se melhor do que a rodeia.
Começa a agitação.
Apesar de não saber em que hospital se encontrava, achava que ainda estava no Curry Cabral, percebe que está presa.
As visitas passam a ser mais difíceis. Pensa sempre que sairá naquela hora, que alguém lhe dará alta e poderá vir embora connosco.
Começam as mentiras.
Temos que tentar contornar sempre o assunto.
Enganá-la.
Dizer que ficaríamos à espera dela na rua.
E então ela sentava-se à porta da sala do médico e esperava ser atendida, esperava por uma alta que nunca aconteceria.
Não naquele dia.
Nessa altura,apesar de melhor, ainda estava muito confusa. Dizia que nos telefonaria do seu telemóvel para subirmos e irmos buscá-la.
Não havia telemóvel nenhum.
Quase não passava tempo nenhum connosco na visita.

Com medo de passar a hora e não poder sair, sentava-se ao pé das salas dos médicos e esperava.

E nós esperávamos, sozinhos, na sala das visitas.
À medida que os dias passavam foi ficando mais irascível.
Era agressiva principalmente com os mais chegados. Chegou a gritar-me que eu não a ajudava a sair dali.
E de cada vez que isso acontecia o meu coração partia-se.
Os corações também se partem.

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